Neste último dia 10 passado, comemoraria-se o aniversário de um dos maiores compositores que o Brasil já teve - Lamartine de Azeredo Babo - o nosso Lalá, magricelo de vozinha fina, que sempre fazia ponta nas músicas gravadas nos anos 30, em especial em suas composições. Dá-se o destaque na marcha carnavalesca "Grau Dez", com Francisco Alves para o carnaval de 1935. Além de compositor, era produtor, revistógrafo, humorista e radialista.
*Lamartine Babo, o Lalá (1904-1963)
Seus trocadilhos também o fizeram famoso e os casos em que envolviam sua aparência sempre eram hilários. Aconteceu, um dos casos mais pitorescos, nos correios: Lalá foi enviar um telegrama, o telegrafista bateu então o lápis na mesa em morse para seu colega: "Magro, feio e de voz fina". Lalá tirou o seu lápis e bateu: "Magro, feio, de voz fina e ex-telegrafista".
RESUMO BIOGRÁFICO
1915
Foi matriculado no Colégio São Bento, onde cursou o ginásio. Ainda na época do São Bento, compôs um foxtrote Pindorama, um desafio de fazer música usando apenas as notas sol, dó, mi. Por essa época, venceu concurso escolar com a poesia "O frade que pedia esmola".
1917
Fez sua primeira valsa Torturas de amor, em homenagem a seu pai que faleceria neste mesmo ano.
1919
Compôs a Ave-Maria, feita exclusivamente para seu casamento, o que nunca se realizou, pois Lamartine casou-se, posteriormente, apenas em cerimônia civil, portanto não solene, com Maria José Babo, com quem não teve filhos. Fez ainda outras músicas religiosas, inclusive um Hino do Jubileu episcopal. Concluído o ginásio, ingressou no Colégio Pedro II, onde se bacharelou em letras.
1920
Desejou cursar a Escola Politécnica, mas foi impedido pelas circunstâncias - dificuldades econômicas pelas quais sua família passava. Foi então obrigado a empregar-se como office-boy da Light, o que lhe permitia vez por outra freqüentar as torrinhas do Teatro Municipal, do Teatro Lírico e do São Pedro de Alcântara (atual Teatro João Caetano). Neste mesmo ano, ainda sem formação técnica musical, compôs "Cibele", sua primeira opereta. A esta seguiram-se "Viva o amor" iniciada em 1926 e concluída em 1940, onde estava incluída a valsa Eu sonhei que tu estavas tão linda (parceria com Francisco Mattoso) e Lola, que no entanto não foram encenadas.
1922
Colaborou com o teatro de revista para o qual compôs Agüenta seu Filipe.
1923
Suas qualidades de bom humor e facilidade de inventar piadas lhe transformaram em colaborador da revista "Dom Quixote", que, dirigida por Bastos Tigre, era uma publicação especializada em humorismo, sátiras e críticas aos costumes da época.
1924
Passou a escrever em "Paratodos" e "Shimmy", usando os pseudônimos de Frei Caneca, Poeta Cinzento, T. Mixto, Janeiro Ramos, entre outros. Ainda em 1924, desligou-se da Light, empregando-se na Companhia Internacional de Seguros.
Sua amizade com Eduardo Souto, compositor e proprietário da Casa Carlos Gomes que financiava a saída de blocos para exibições na Festa da Penha e nas batalhas de confete que antecediam o carnaval, o levou a sair pela primeira vez num desses blocos o "Tatu subiu no pau", cantando a marchinha "Não sei dizê", de Eduardo Souto.
1925
Começou a compor para os ranchos da época dentre os quais Recreio das Flores, Africanos, Jardim dos Amores e Ameno Resedá, conquistando algum sucesso com a marchinha "Foi você". Por essa mesma época, tornou-se assíduo colaborador do teatro de revista. Compôs músicas para "Prestes a chegar", "É da pontinha", "Paulista de Macaé" e "Vai haver o diabo". Paralelamente, escrevia suas próprias peças como "Pequeno polegar" e "Este mundo vai mal". No ano seguinte, estreou em São Paulo com a peça "Na penumbra", feita em parceria com De Chocolat e montada pela Companhia Negra de Revista, espetáculo que contava com a participação de Pixinguinha.
1926
O jornal Estado de São Paulo, em 12 de novembro de 1926, publicava que "o notável flautista Pixinguinha é simplesmente extraordinário". Durante a curta temporada, Lamartine intermediou o encontro de Pixinguinha com o musicólogo Mário de Andrade que estava na época coletando material para a feitura de um livro que teria fundamental importância na carreira do compositor: "Macunaíma o herói sem nenhum caráter". O resultado deste encontro pode ser apreciado no Capítulo VII da obra que trata da macumba.
1927
Passou para o bloco de Luís Sampaio Nunes, conhecido por Careca, compositor de sucessos carnavalescos e vencedor dos carnavais de 1920, 1922 e 1924. Como revistógrafo e compositor, fez sucesso com a revista -burleta "Os calças-largas", de Freire Júnior (novembro de 1927), tendo a marcha - título da peça feita em parceria com Gonçalves de Oliveira - sido gravada na Odeon pelo barítono Frederico Rocha para o carnaval de 1928, sua primeira composição levada ao disco. Neste mesmo ano, musicou a revista "Ouro à beça", com Inácio Stábile e Henrique Vogeler dividindo a autoria do texto com Djalma Nunes e Jerônimo Castilho.
1928
Para ajudar no orçamento, foi professor de dança nos clubes Tuna Comercial e Ginástico Português. Escreveu a burleta "Este mundo vai mal", que obteve grande sucesso e colaborou na revista "Vai haver o diabo", que estreou em novembro do mesmo ano.
1929
Iniciou sua carreira no rádio, na Educadora, onde cantava com sua voz de falsete acompanhado pelo piano de Ary Barroso, contava piadas e fazia sketches.
1930
Em pouco tempo, teve seu próprio programa, "Horas Lamartinescas", onde se apresentavam entre outros Noel Rosa e Marília Batista. Neste mesmo ano, venceu o concurso de músicas carnavalescas promovido pela revista O Cruzeiro com a marchinha "Bota o feijão no fogo".
1931
Ganhou o concurso de carnaval da Casa Edison com "Bonde errado" e fez sucesso com "Lua cor de prata" e "Minha cabrocha" e "O barbudo foi-se". É deste mesmo ano a letra que fez para a composição de Ary Barroso "Na grota funda". Na verdade, Ary Barroso havia musicado versos de J. Carlos. Lamartine gostou da melodia mas achou que esta merecia versos seus. E assim, com a aprovação do parceiro melodista, nasceu o samba-canção "No rancho fundo", que foi lançado ainda em 1931 por Elisinha Coelho. Os dois parceiros voltariam a compor juntos em "Na virada da montanha" e "Grau dez". No ano seguinte, Lamartine reinou no carnaval. Um dos sambas mais divulgados foi o seu "Só dando com uma pedra nela", gravado por Mário Reis. Entre as mais cantadas, estava a marchinha "A.E.I.O.U", feita em parceria com Noel Rosa.
1932
Foi finalmente o ano de "O teu cabelo não nega", verdadeiro hino do carnaval carioca. Além de um grande êxito, a composição foi também um grande problema de direito autoral, por ter sido uma adaptação da marcha "Morena", composta pelos Irmãos Valença, pernambucanos que reclamaram a autoria e que passaram então a assinar a composição ao lado de Lamartine. A marcha foi gravada pelo cantor Castro Barbosa. Curiosamente, segundo relato de Jonjoca (com quem Castro formava uma dupla), "O teu cabelo não nega" lhes foi mostrada por Lamartine em um encontro casual na Cinelândia. A dupla adorou a música e Lamartine lhes disse "é de vocês, podem gravá-la". Dias depois, como iam também gravar "Bandonô", de autoria de Jonjoca, este teve a seguinte (e infeliz) idéia : " Ô Castro, vamos gravar essas músicas individualmente. Voce fica com uma e eu com a outra. Quanto à escolha, decidimos num cara ou coroa. Deu cara, e eu fiquei com 'Bandonô.' "
1933
Lamartine fez sucesso com "Chegou a hora da fogueira", gravada inicialmente por Carmen Miranda e Mário Reis com arranjo de Pixinguinha, "Linda Morena", "Moleque indigesto", "A tua vida é um segredo", "Aí, hein?" e "Boa bola", as duas últimas parcerias com Paulo Valença.
1934
Compôs "Uma andorinha não faz verão", parceria com João de Barro, que se tornou sucesso na voz de Mário Reis e a marchinha "Ride palhaço" inspirada em motivo da ópera I Pagliacci de Ruggiero Leoncavallo (1858-1919).
1935
Mais uma vez venceu o carnaval com "Grau dez" (nota que os compositores deram à morena) parceria com Ary Barroso e fez sucesso com "Rasguei minha fantasia" .
1936
Destacou-se com a "Marchinha do grande galo", uma parceria com Paulo Barbosa. Ainda neste ano, participou do filme "Alô,alô, Carnaval", dirigido por Wallace Downey, onde cantava com Almirante a marchinha "As armas e os barões assinalados".
1937
Suas composições carnavalescas tornaram-se eventuais passando então a fazer sucesso com sambas-canções. O destaque deste ano vai para "Serra da boa esperança", composição na qual Lamartine mostra a excelência de sua arte, onde letrista e compositor se igualam em bom gosto e artesanato. Ainda em 1937 transferiu-se para a Rádio Nacional onde produziu o "Clube dos fantasmas" e a série "Vida pitoresca e musical dos compositores da nossa música popular".
1939
Uma composição carnavalesca, o "Hino do carnaval brasileiro", tem a pretensão de ser o hino oficial do carnaval, o que não acontece, até porque "O teu cabelo não nega" já havia sido consagrada como tal, fato confirmado pelas décadas que se seguiram. Neste mesmo ano, surgiram dois sambas: "Cessa tudo" (com Celso Machado) interpretado por Sílvio Caldas e "Voltei a cantar", canção do musical "Joujoux e balangandãs", que marcou o retorno ao disco do cantor Mário Reis. Após ausência das gravações por um período de três anos o cantor voltou ao disco registrando também "Joujoux e balangandãs", marcha de Lamartine Babo, grande sucesso do espetáculo beneficente de mesmo nome realizado no Rio de Janeiro no ano de 1939, patrocinado pela então primeira dama, D. Darcy Vargas. A composição mostra um diálogo musical entre um brasileiro e uma francesa, vividos no palco e no disco por Mário Reis e Mariah (pseudônimo da senhora da alta sociedade da época, Maria Clara Correia de Araújo). Dois anos mais tarde, Lamartine compôs a valsa "Eu sonhei que tu estavas tão linda", que pretendia incluir numa opereta inacabada intitulada "Viva o amor". A melodia da valsa é de Francisco Mattoso.
1941
A valsa foi gravada por Francisco Alves. Em suas atividades como radialista, foi exclusivo da Rádio Mayrink Veiga durante os anos de 1933 a 1937, tendo produzido os programas "Canção do dia", em que apresentava uma música inédita por programa, e "Clube da meia-noite".
1942
Criou o programa "Trem da alegria", que se tornaria um dos mais famosos do Brasil tendo sido apresentado em diversas emissoras de rádio. O programa contava com a participação do "Trio de osso", integrado por Héber de Bôscoli, Iara Sales e Lamartine, e seguiu no ar até 1956, ano de falecimento de Héber de Bôscoli . Lamartine, a partir daí, abandonou o rádio, passando a se dedicar à direção da UBC (União Brasileira de Compositores). Voltaria poucos anos depois ao rádio, na Roquette Pinto, emissora oficial do então Estado da Guanabara. Além de produzir programas para a televisão, foi produtor da Copacabana Discos e publicou livros humorísticos e alguns versos. Gravou dois LPs na Sinter.
*Os dois LPs prensados pela Sinter nos anos 50 do Lalá
1958
Compôs a marcha-rancho "Os rouxinóis", lançada na revista "Bom mesmo é mulher", a pedido do Rancho Rouxinóis da Ilha de Paquetá. A música obteve sucesso e seria uma das mais executadas naquele carnaval. Encerrou sua carreira de compositor com "Ressureição dos velhos carnavais" (1961) e "Seja lá o que Deus quiser" (1963).
1963
Carlos Machado produziu na boate Golden Room do Copacabana Palace o show "O teu cabelo não nega", baseado na vida de Lamartine. Lalá, como era conhecido, assistiu aos ensaios mas não chegou a ver a montagem do espetáculo. Faleceu dias antes da estréia vitimado por um ataque cardíaco.
Fica aqui, nossa singela homenagem ao Lalá, em vésperas do carnaval, festa que amou como ninguém.
*Créditos:
Collector's.com
Fotos retiradas da internet
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